A pedido do Jornal de Negócios respondi a quatro perguntas sobre a saída do Jon Stewart do Daily Show, aqui as deixo:
1- O Jon Stewart criou um modelo que através do humor resumia e decifrava as notícias do momento, tendo assim também uma vertente jornalística. Este modelo poderá ser replicado pelo seu substitutos ou outros, ou é único?
1- Hoje, muito do jornalismo tem evoluído no caminho que ele lançou. Logo, o seu modelo poderá ser replicado. Porém, o seu carisma e a sua fortíssima marca pessoal levarão tempo a ser igualados por outros. Jon Stewart não era um jornalista, mas actuava sobre os conteúdos jornalísticos. Para ele o que contava era a verdade e o que era falso. Era honesto e por isso a Time o considerou o locutor noticioso em que os americanos mais confiavam.
2- De que forma o programa e o próprio Jon Stewart alteraram o panorama dos media e da política?
2- JS e o Daily Show tornaram a cultura democrática mais mediática e ao alcance de todos e de todos os públicos. As notícias passaram a ser entretenimento e a política teve de se adaptar a este novo ângulo de abordagem noticiosa. Depois, o seu programa chegava a uma audiência/eleitorado jovem que habitualmente não liga a questões políticas. Por isso os políticos também viram ali uma oportunidade de se aproximarem de uma faixa que se alheava da sua mensagem. Os políticos deixaram o seu pedestal e tiveram que vestir umas vestes mais "cool" para saírem bem do seu programa. Assim o Daily Show desmistificou e desarmou a couraça de quem se levava a sério de mais
3- Ao longo dos anos Jon Stewart foi também ganhando uma força de influência política. Porquê? Como se pode explicar esta situação?
3- a sua influência veio pelas audiências e pela credibilidade que granjeou nestes 16 anos de programa. Não alinhava com a mentira e não tinha medo de enfrentar os poderosos. A sorrir e a fazer rir vestiu causas e tornou-as acessíveis a todos. A linguagem do humor inteligente é poderosamente eficaz e navegou pelo entretenimento mudando o estilo de jornalismo. Era honesto e independente e isso robusteceu a sua marca pessoal. Esse é o seu maior legado e influência que deixa
4- Influenciou, de alguma maneira, a política interna norte-americana? Nomeadamente a transição Bush/Obama?
4- É sabido que JS, sem tomar partido, era mais simpático para os Democratas do que para os Republicanos. Atacou Cheney, Rumsfeld e W. Bush na mentira da guerra do Iraque, mas também atacou as insuficiências do Obamacare. Foi um centro de independência sem se misturar com as querelas internas da política americana. Mas a sua capacidade de entrar na linguagem dos mais jovens foi essencial para o triunfo da linguagem de proximidade da geração Obama. Ao fim de 16 anos são muitos no mundo que gostariam de fazer um decreto - como Obama lhe disse a brincar na ultima entrevista - a proibir a saída de Jon Stewart do Daily Show. Para já o jornalismo, o debate e a comunicação política ficarão mais pobres nos próximos tempos. Mas "the show must go on"
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sábado, 8 de agosto de 2015
quinta-feira, 23 de julho de 2015
Obama, Jon Stewart e Jon Snow
Obama é provavelmente o presidente americano que mais se assemelhou a uma estrela pop. Desde a sua campanha até à sua posterior estadia na Casa Branca, a sua acção política sempre se misturou em termos de comunicação política com os principais ícones da cultura americana, integrando-se e integrando-os.
Obama, nos últimos dias, deu a sua última entrevista ao "Daily Show", do Jon Stewart. Um excelente momento de televisão, que passou pela sua postura descontraída, pelo seu humor - por exemplo ao dizer que tinha emitido um decreto: «o Jon Stewart não sai do Daily Show"» -, mas combinando tudo com as mensagens políticas que queria passar, nomeadamente a satisfação com o acordo nuclear obtido com o Irão, carimbado com um soundbyte forte: «não se faz a paz com amigos».
Nesta semana, foi notícia também uma conversa do presidente com David Nutter, realizador de outro fenómeno da cultura americana e não só, "A Guerra dos Tronos, da qual Obama é fã. «Ao site Entertainment Weekly, o realizador David Nutter contou que o presidente dos Estados Unidos lhe colocou "a mão no ombro" e perguntou: "Você não matou o Jon Snow, pois não?". A resposta não tardou. "Jon Snow está mais do que morto", retorquiu Nutter. "Tive medo que ele me enviasse para [a prisão de] Guantánamo, mas felizmente ainda estou aqui", brincou o realizador, acrescentado que, "quanto a Jon Snow, ele está morto". A terminar, e sem ser capaz de esconder a sua deceção, Obama desabafou: "Você mata sempre as minhas personagens favoritas".
Dois exemplos em como a comunicação política terá de se descontrair e saber conviver com a cultura pop. Os políticos ganharão com isso.
Obama, nos últimos dias, deu a sua última entrevista ao "Daily Show", do Jon Stewart. Um excelente momento de televisão, que passou pela sua postura descontraída, pelo seu humor - por exemplo ao dizer que tinha emitido um decreto: «o Jon Stewart não sai do Daily Show"» -, mas combinando tudo com as mensagens políticas que queria passar, nomeadamente a satisfação com o acordo nuclear obtido com o Irão, carimbado com um soundbyte forte: «não se faz a paz com amigos».
Nesta semana, foi notícia também uma conversa do presidente com David Nutter, realizador de outro fenómeno da cultura americana e não só, "A Guerra dos Tronos, da qual Obama é fã. «Ao site Entertainment Weekly, o realizador David Nutter contou que o presidente dos Estados Unidos lhe colocou "a mão no ombro" e perguntou: "Você não matou o Jon Snow, pois não?". A resposta não tardou. "Jon Snow está mais do que morto", retorquiu Nutter. "Tive medo que ele me enviasse para [a prisão de] Guantánamo, mas felizmente ainda estou aqui", brincou o realizador, acrescentado que, "quanto a Jon Snow, ele está morto". A terminar, e sem ser capaz de esconder a sua deceção, Obama desabafou: "Você mata sempre as minhas personagens favoritas".
Dois exemplos em como a comunicação política terá de se descontrair e saber conviver com a cultura pop. Os políticos ganharão com isso.
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quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015
Jon Stewart e Brian Williams: duas faces da informação
Causou impacto a saída de Jon Stewart da apresentação do Daily Show. Dezasseis anos a apresentar a sátira política e social que nunca cansaram.
Recordo que ele não era um jornalista, mas um comediante que fazia reflectir com o seu humor genial, independente, sem balizar os assuntos entre esquerda e direita, entre Republicanos e Democratas, apenas usava a notícia para criar entretenimento.
Porém, essa sua independência tornou-o um líder de opinião respeitável e credível. Ganhou aquilo que muitos jornalistas lutam toda uma vida: uma reputação sólida e sem mentiras.
Por outro lado, Brian Williams era um respeitável jornalista, escolhido pela NBC para substituir uma das suas míticas "âncoras", Tom Brokaw.
«Em 2003, Williams deslocou-se ao Iraque com as tropas norte-americanas, tendo relatado, após o seu regresso, que o helicóptero onde viajava esteve debaixo de fogo. Num comunicado, a presidente da NBC, Deborah Turness, afirmou que esta descrição foi "errada e completamente inapropriada para alguém na posição de Brian"» (retirei esta passagem da notícia do DN).
Caiu assim na esparrela de transformar a sua vida em notícia, foi seduzido pelo lado do entretenimento, tentando gerar uma proximidade emocional com os espectadores. E mentiu. A sua reputação de solidez e a confiança de verdade que um jornalista tem de dar à notícia ficou fatalmente beliscada. E a credibilidade é como a virgindade, quando se perde nunca se recupera.
Jon e Brian são duas faces da notícia. Mas o comediante nunca mentiu, o jornalista tornou-se algo que nunca devia acontecer. A verdade vale muito mais do que o entretenimento, essa é a verdade indissociável da boa reputação.
Recordo que ele não era um jornalista, mas um comediante que fazia reflectir com o seu humor genial, independente, sem balizar os assuntos entre esquerda e direita, entre Republicanos e Democratas, apenas usava a notícia para criar entretenimento.
Porém, essa sua independência tornou-o um líder de opinião respeitável e credível. Ganhou aquilo que muitos jornalistas lutam toda uma vida: uma reputação sólida e sem mentiras.
Por outro lado, Brian Williams era um respeitável jornalista, escolhido pela NBC para substituir uma das suas míticas "âncoras", Tom Brokaw.
«Em 2003, Williams deslocou-se ao Iraque com as tropas norte-americanas, tendo relatado, após o seu regresso, que o helicóptero onde viajava esteve debaixo de fogo. Num comunicado, a presidente da NBC, Deborah Turness, afirmou que esta descrição foi "errada e completamente inapropriada para alguém na posição de Brian"» (retirei esta passagem da notícia do DN).
Caiu assim na esparrela de transformar a sua vida em notícia, foi seduzido pelo lado do entretenimento, tentando gerar uma proximidade emocional com os espectadores. E mentiu. A sua reputação de solidez e a confiança de verdade que um jornalista tem de dar à notícia ficou fatalmente beliscada. E a credibilidade é como a virgindade, quando se perde nunca se recupera.
Jon e Brian são duas faces da notícia. Mas o comediante nunca mentiu, o jornalista tornou-se algo que nunca devia acontecer. A verdade vale muito mais do que o entretenimento, essa é a verdade indissociável da boa reputação.
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